VALOR | TJ-SP EXCLUI AÇÕES DE PENSÃO ALIMENTÍCIA

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Públicada em: quinta-feira, novembro 18, 2021

Fonte: Valor Econômico | Publicado em 18/11/2021 | Clique aqui e veja a publicação original

Valores recebidos na venda de ações de planos de “stock options” – geralmente adotados para atrair ou reter profissionais nas companhias – não podem ser incluídos na base de cálculo do pagamento de pensão alimentícia. Assim decidiu, de forma inédita, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

Para os desembargadores, essas quantias não podem ser consideradas remuneração. Por isso não deveriam ser incluídas no cálculo do pagamento de pensão alimentícia. Em geral, os juízes determinam que seja retida pela empresa uma porcentagem do salário do devedor para ser repassado a quem tem direito à pensão.

Somente o TJ-SP proferiu 535 decisões sobre pensão alimentícia, em 2021, até o fim de setembro. Em 2020, foram 945 decisões e em 2019, 873.

Por meio dos planos de stock options, as companhias oferecem a funcionários ações próprias, muitas vezes por valores inferiores aos de mercado, para que o executivo se sinta investidor da empresa onde trabalha.

No caso analisado, uma mulher obteve, por decisão judicial, o direito a 25% dos rendimentos líquidos recebidos pelo ex-marido. A pensão incidiria sobre o salário mensal e outras verbas trabalhistas como férias, 13º salário, horas-extras, comissões, gratificações, abonos, adicionais e Participação de Lucros e Resultados (PLR). Contudo, a decisão não mencionava a situação das stock options.

Em abril deste ano, o ex-marido recebeu parte do valor de venda de ações da companhia onde trabalha, ao participar de um plano da empresa, chamado Restricted Stock Units (RSU) e isso acabou entrando no cálculo da pensão. Inconformado, resolveu entrar na Justiça para questionar a inclusão dessas quantias.

Na primeira instância, teve seu pedido negado pela 3ª Vara de Família e Sucessões de Santos. Assim, ele recorreu ao TJ-SP.

No Tribunal de Justiça paulista, ao analisar o caso, o relator, desembargador Marcus Vinícius Rios Gonçalves, afirmou que no caso do plano analisado, normalmente, não há compra de ações pelo funcionário, mas doação de um pacote de ações pela empresa. Em regra, a venda dessas ações está condicionada à permanência do funcionário na companhia. “Se ele deixar a empresa ou se as ações não alcançarem a valorização prevista, ele nada recebe”.

Não se trata, portanto, segundo o magistrado, de abono ou gratificação, “já que não tem o caráter de habitualidade, não sendo possível nem sequer verificar de antemão se o funcionário irá se beneficiar da venda de ações”. Por isso, para ele, “não há, por ora, como considerá-las incluídas na base de cálculo”.

O magistrado destacou ainda que, no caso dos autos, “a compensação pretendida implicará que a alimentanda fique privada, por algum tempo, dos alimentos que lhe são devidos, o que poderia comprometer o seu sustento” (agravo de instrumento nº 2176649-48.2021.8.26.0000).

Segundo a advogada Maria Berenice Dias, desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a decisão é inovadora. Para ela, realmente não daria para enquadrar as stock options como remuneração. “Há uma tendência muito grande de ir excluindo da obrigação alimentar todos os penduricalhos, de modo geral, mas nesse caso, a decisão parece acertada” diz.

Maria Berenice explica que a linha divisória sobre quais valores devem entrar no cálculo da pensão é a discussão sobre a natureza remuneratória. Verbas indenizatórias, como despesas do funcionário com viagens, diárias, ainda que se receba juntamente com o salário, não integram a remuneração.

Na opinião do advogado da área cível, Luís Cascaldi, do Martinelli Advogados, o principal ponto de discussão se dá com relação à habitualidade no pagamento das verbas. “Verbas esporádicas, que fogem do normal e não integram a remuneração, não podem entrar no cálculo da pensão alimentícia”, diz. Contudo, ele afirma que os valores ganhos com a venda de ações [stock options] poderiam quitar dívidas de pensão. “Nesse caso, qualquer crédito pode entrar para assegurar a execução, como dinheiro que o devedor ganhou de herança ou com ações”, diz.

O tema traz curiosidade ao entrar, agora, na seara do direito de família, segundo o advogado Fabio Medeiros, do Lobo de Rizzo. Ele já é discutido há anos na Justiça do Trabalho e na área tributária. “Na Justiça do Trabalho já temos um entendimento consolidado faz bastante tempo de que se o empregado pagar algo por essas ações, seria um contrato mercantil, e não teria natureza remuneratória”, diz.

Na área tributária, a discussão com a Receita Federal também envolve a natureza desses programas – se é mercantil (um contrato) ou remuneratória (salário indireto). Empresas e empregados defendem a natureza mercantil. Ou seja, a incidência de Imposto de Renda (IR) apenas sobre o ganho de capital decorrente da diferença entre o valor de aquisição e o de venda das ações a terceiros. A alíquota do IR, no caso, varia de 15% a 22,5%.

Já para a Receita Federal seria salário porque incidiria Imposto de Renda e contribuição previdenciária, a cargo das empresas. Os trabalhadores teriam que recolher o IR em dois momentos: no exercício da opção de compra das ações (27,5%) e na venda a terceiros (ganho de capital).

As decisões, nesta seara, costumam ser favoráveis aos contribuintes. Levantamento do escritório Mattos Filho, divulgado em reportagem anterior do Valor, mostra que 75,86% de 174 decisões localizadas em primeira e segunda instâncias beneficiam trabalhadores e empresas.

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