VALOR | PANDEMIA GERA RECORDE DE CASOS NA JUSTIÇA POR OCULTAÇÃO DE PATRIMÔNIO

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Públicada em: sexta-feira, julho 8, 2022

Fonte: Valor | Publicado em 07/07/2022 | Clique aqui e veja a publicação original

A pandemia gerou um volume recorde de processos judiciais contra empresas endividadas por ocultação de patrimônio. Levantamento do escritório Martinelli Advogados mostra que, no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), foram proferidos no ano passado 6.731 acórdãos para o redirecionamento da cobrança a sócios ou terceiros, após a alegação desse tipo de fraude. O volume representa um crescimento de 33% em relação a 2019 e é o dobro do registrado no ano anterior.

Essa situação, segundo especialistas, ocorre principalmente em épocas de crise. Com o aumento da inadimplência, empresas em dificuldade decidem tomar medidas irregulares na tentativa de proteger ser patrimônio de eventuais cobranças. Credores são obrigados, então, a vasculhar a vida de sócios para tentar localizar bens.

Desde a crise econômica de 2008, as companhias com dívidas passaram a adotar com mais frequência práticas para blindar seu patrimônio, segundo o advogado Columbano Feijó, sócio da Falcon, Gail, Feijó e Sluiuzas Advogados. “A pandemia fez com que isso aumentasse de novo, já que algumas atividades ficaram paralisadas, a inadimplência aumentou exponencialmente e muitas empresas em dificuldade tomaram medidas irregulares”, diz.

Hoje, mais de 6,1 milhões de companhias estão inadimplentes, segundo levantamento da Serasa Experian, de maio. Do total, 52,7% são do setor de serviços. Em seguida, vêm o comércio (38,1%), a indústria (7,9%) e o setor primário (0,9%).

A maior parcela de empreendimentos no vermelho está em São Paulo e é de pequeno porte. A inadimplência no empreendedorismo, afirma o economista-chefe da Serasa Experian, Luiz Rabi, ainda deve se estender enquanto a economia permanecer instável.

De acordo com o economista e advogado Alessandro Azzoni, muitas empresas fecharam as portas ou estão endividadas e não conseguem honrar suas dívidas. Principalmente, bares e restaurantes, que sofreram muito com as restrições sanitárias. “Ninguém esperava que essa situação durasse por mais de dois anos”, diz.  “E muitas que já estavam endividadas se tornaram insolventes.”

Essas empresas têm sido agora alvo de ações judiciais de cobrança. E quando os credores não conseguem localizar bens desses devedores, entram com o chamado incidente de desconsideração da personalidade jurídica – que permite atingir bens de terceiros e responsabilizar sócio ou administrador pela dívida, em caso de fraude.

São casos em que os devedores tentam esconder seus bens, por meio de blindagens patrimoniais irregulares, muitas vezes utilizando-se de terceiros (laranjas). Contudo, conseguir uma decisão favorável, nesses casos, não é simples, de acordo com Azzoni.  “Tem que provar que houve fraude, que durante a execução a empresa vendeu seus bens ou transferiu para terceiros para não quitar sua dívida”, afirma.

Segundo o advogado Luís Cascaldi, do Martinelli Advogados, que coordenou a pesquisa no site do TJSP, esse crescimento no número de casos é reflexo da crise econômica gerada com a pandemia. O levantamento, explica, traz número de acórdãos, e não de processos – ou seja, pode existir mais de um acórdão em um mesmo processo.  Porém, acrescenta, deve se levar em consideração que, nessa conta, não entraram muitos casos que correm em segredo judicial para que os outros credores não saibam da busca e localizem primeiro os bens.

Para auxiliar nas buscas de bens, ele afirma que a banca tem usado parcerias e adotado ferramentas de tecnologia para fazer dossiês aos credores, mostrando o que se poderia pedir nesses processos e se existiriam chances de recuperação dos valores. Nesses casos, destaca, as redes sociais têm sido importantes. “Em um dos processos descobrimos que o devedor era dono de um haras, que estava em nome de terceiros, por uma foto publicada”, diz.

A possibilidade de atingir bens de terceiros em caso de fraude está prevista no artigo 50 do Código Civil. E a forma como esse procedimento deve ser conduzido pelo juiz está prevista nos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil (CPC).

“As redes sociais têm sido fundamentais para esse tipo de trabalho. O devedor oculta seu patrimônio, mas não quer abandonar o status. É comum ter postagens de uma vida de luxo, passeio de lancha, viagem pela Europa”, afirma o advogado Columbano Feijó.  De acordo com ele, para receber, o credor acaba sendo obrigado a revirar a vida da empresa e de seus sócios. Na pesquisa patrimonial, além das redes sociais, costuma-se fazer um levantamento detalhado das escrituras públicas, procurações e atos societários.

Feijó assessorou recentemente uma empresa credora, que cobrava uma dívida superior a R$ 500 mil pela compra de um maquinário de grande porte. Nas buscas, descobriram que foi aberta uma nova empresa no local onde funcionava a devedora, com os mesmos funcionários, mesmos telefones e mercadorias, mas que estava em nome de outra pessoa. Essa pessoa era o filho de um dos sócios, de 21 anos, que se apresentava como músico nas redes sociais, sem possuir vinculação com as atividades da empresa (processo nº 0003295-31.2021.8.26.0577).

Já quando se tratam de grandes grupos econômicos, as ações de ocultação de patrimônio ficam mais sofisticadas, segundo Feijó. São criadas empresas com a única finalidade de esvaziar e esconder bens por meio de práticas de confusão patrimonial. Em um dos casos em que atua, que envolve uma grande construtora, tenta-se recuperar mais de R$ 3 milhões devidos por uma empresa de engenharia, por processos trabalhistas não pagos. A construtora teve que quitar as verbas por ser responsável subsidiária.

No processo, o advogado afirma que conseguiu provas de que a devedora atuou como prestadora de serviços de mão de obra para construção de edifícios. Também de que ela faz parte de um grupo fraudulento, que conta com a criação de mais de 20 empresas para esvaziar e ocultar patrimônios. Feijó já conseguiu uma medida cautelar no TJSP para que seja feito um arresto dos valores nas contas bancárias das empresas até decisão em tribunal arbitral sobre o caso.

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