LOGWEB | BR DO MAR: INCENTIVO À CABOTAGEM DEVE TRANSFORMAR A LOGÍSTICA DO BRASIL. QUANDO TODOS OS NÓS ESTIVEREM DESATADOS

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Públicada em: quinta-feira, junho 23, 2022

Fonte: LogWeb | Publicado em 3/6/2022 | Clique aqui e veja a publicação original

Ainda é difícil mensurar o exato impacto da cabotagem na logística brasileira, tendo em vista a iniciativa ser incipiente e depender da adesão do mercado para funcionar. De uma forma geral, a expectativa é que ocorra uma redução de custos logísticos.

O desejo antigo de fomentar a cabotagem no Brasil tornou-se realidade com a aprovação da Lei n° 14.301/2022. Trata-se da norma que institui o estímulo ao transporte por cabotagem, conhecido como “BR do Mar” e que permite a navegação entre portos ou pontos da costa brasileira. A medida legislativa tem como objetivo aumentar a oferta da cabotagem, incentivar a concorrência, criar novas rotas e reduzir custos.

Em essência, o projeto de lei, apresentado em agosto de 2020 e sancionado em janeiro de 2022, focou em quatro eixos temáticos importantes: frota, indústria naval, custos e porto.

“A facilitação da entrada de embarcações estrangeiras no Brasil para a realização do transporte de cabotagem, que até então ocorria de forma restrita às embarcações brasileiras, é um aspecto relevante trazido pelo Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem, no contexto da matriz de transporte no País”, destaca Carmem Grasiele da Silva, advogada especialista em comércio internacional do Martinelli Advogados.

Por outro lado, ela lembra que a extensão continental do território brasileiro sempre desafiou a matriz de transporte no país. A predominância do modal rodoviário no Brasil, conforme dados da Fundação Dom Cabral, pode chegar a 75% frente aos demais modais (9,4%, modal marítimo; 5,8%, modal aéreo; 5,4%, modal ferroviário; 3%, cabotagem e apenas 0,7% no sistema hidroviário).

“Anteriormente, o presidente Jair Bolsonaro havia vetado a recriação do Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária – Reporto. Porém, ele foi restabelecido pelo Congresso em 17 de março último”, acentua, agora, Luiz Ramos, presidente do SINDICOMIS – Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Carga e Logística do Estado de São Paulo e da ACTC – Associação Nacional das Empresas Transitárias, Agentes de Carga Aérea, Comissárias de Despachos e Operadores Intermodais.

De acordo com as associações empresariais, o veto, se confirmado, iria redundar num “apagão” de investimentos nos portos. Com isso, a vigência do Reporto, que havia sido extinto no fim do ano passado, fica ampliada até dezembro de 2023. Além de ampliar o prazo de duração do Reporto, os parlamentares definiram que o benefício também passará a valer para empresas de dragagem, recintos alfandegados de zona secundária e centros de formação profissional e treinamento multifuncional do trabalhador portuário.

“O desastre seria de tal monta que o próprio governo federal entendeu a estultice da medida e passou a defender também a derrubada do veto que ele mesmo deu ao Reporto, sob a alegação de que o regime contrariaria a lei de responsabilidade fiscal. Como se sabe, o Reporto suspende quatro impostos referentes à importação de máquinas e equipamentos pelos terminais portuários: Imposto de Importação, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins)”, diz Liana Lourenço Martinelli, advogada, pós-graduada em Gestão de Negócios e Comércio Internacional e gerente de Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG) do Grupo Fiorde.

A gerente ressalta que essas decisões do Congresso representaram uma vitória das entidades do setor portuário, especialmente da Federação Nacional das Operações Portuárias – Fenop, que procuraram mostrar incansavelmente aos congressistas a importância do benefício do Reporto para o crescimento dos portos e do País.

“Segundo cálculos da Associação Brasileira de Terminais Portuários – ABTP, sem o Reporto, com a incidência daqueles impostos, os materiais de movimentação de cargas sofreriam um aumento de 40% no preço de importação, o que poderia provocar um congelamento em investimentos da ordem de R$ 2 bilhões, já que haveria a necessidade de reequilíbrio dos contratos, tendo em vista que foram firmados considerando a vigência daquele regime tributário. Além disso, cresceria a insegurança jurídica, o que poderia provocar uma fuga de investidores no País”, completa Liana.

O Congresso também rejeitou o veto ao dispositivo relacionado ao Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), que trazia regras de cálculo de frete nas navegações e previa a diminuição de 25% para 8% do percentual para a navegação de longo curso, e de 10% para 8% para cabotagem.

O AFRMM é disciplinado pela Lei 10.893/2004, e incide sobre a remuneração do transporte aquaviário, entendido como custo do transporte porto a porto, acrescido dos custos com o manuseio da carga, realizada antes e depois desse transporte (art. 5º, §1º, Lei 10.893/2004). As alíquotas do tributo estão previstas no seu artigo 6º, da seguinte forma: (1) 25% para navegação longo curso; (2) 10%para cabotagem; e (3) 40% para navegação fluvial e lacustre, no transporte de granéis sólidos e líquidos para as regiões Norte e Nordeste.

A versão final do PL, aprovada pelos Congressistas, contava com uma redução significativa desses percentuais. O artigo 21, do PL, alterava o artigo 6º da Lei 10.893/2004, para prever as seguintes alíquotas: (1) 8% para navegação de longo curso; (2) 8% para cabotagem; (3) 40% para navegação fluvial e lacustre, quanto ao transporte de granéis líquidos para as regiões Norte e Nordeste; e (4) 8% para navegação fluvial e lacustre, quando do transporte de granéis sólidos destinados à região Norte e Nordeste.

O governo alegou que o dispositivo incorreria em vício de inconstitucionalidade e em contrariedade ao interesse público, pois acarretaria renúncia de receitas sem a apresentação da estimativa do impacto orçamentário e das medidas compensatórias. “Para navegações de longo curso, de cabotagem e as fluviais e lacustres (quando do transporte de granéis sólidos e outras cargas nas regiões Norte e Nordeste), as alíquotas serão de 8%, enquanto para o transporte de granéis líquidos nos rios e lagos das regiões Norte e Nordeste, a taxa será de 40%, lembra Liana, do Grupo Fiorde.

“Com a redução da taxa para 8%, é possível criar um ambiente de maior competitividade entre os intervenientes e reduzir custos de importação, com reflexos nos insumos usados pelo agronegócio”, aponta Ramos, do SINDICOMIS.

Impacto na logística

Analisando os impactos da BR do Mar na logística brasileira, Alexandre Aroeira Salles, doutor em Direito e sócio fundador da banca Aroeira Salles, destaca que o maior deles é o de aumentar a competitividade do setor de transporte de cabotagem, aumentando o volume de carga a ser transportada e atraindo investimentos nacionais e internacionais, além de diminuir o custo do transporte dentro do Brasil.

“A logística é uma cadeia. Cada elo dessa cadeia precisa ser otimizado ao máximo para sermos competitivos. Sendo assim, ampliando a oferta de um dos elos, no caso a cabotagem, as indústrias e os Operadores Logísticos contam com mais uma opção para otimizar ao máximo a logística. Precisamos entender qual modal é o mais viável para cada negócio e região. Hoje, o Brasil é, predominantemente, rodoviário e precisamos encontrar e forçar novas formas de modal”, acrescenta, agora, Denny Mews, CEO da CargOn.

Visão parecida tem Marcel Stivaletti, sócio na Advocacia Ruy de Mello Miller (RMM). Partindo da premissa de que a Lei 14.301/22 objetiva o fomento da navegação de cabotagem, toda a cadeia logística será alcançada e, por consequência, espera-se a redução dos custos para a carga. “Não é possível pensar os diversos modais atuando de forma isolada, mas sim integrada. Alavancando-se a navegação nessa modalidade, maior movimentação será sentida nos portos, dada a interação natural entre as etapas do transporte, recepção e movimentação da carga. A carga oriunda da cabotagem, claro, vai desembarcar num determinado terminal portuário, que por sua vez receberá um transportador rodoviário terrestre para leva-la à ‘porta’ do destinatário final. Aparentemente, ganham o modal (cabotagem) e seus atores, mas efetivamente beneficia-se toda cadeia inerente à logística da carga e, principalmente, a carga/usuário. A expectativa é que, com o advento do programa, além do fortalecimento das empresas ora atuantes, surjam mais entrantes (mais EBNs – Empresas Brasileiras de Navegação) e, por consequência, o modal verdadeiramente se apresente como uma atraente opção ao usuário, gerando reflexos positivos em toda cadeia logística e redução de custos.”

De fato, como também apontam Ana Paula Ronchi, advogada Plena da área de Contencioso Tributário e Aduaneiro, e Michel Alkimin, advogado Junior da área de tributário aduaneiro contencioso e consultivo, ambos da Lira Advogados, a cabotagem permitirá novas opções para o transporte de mercadorias dentro do país, em razão do afretamento de embarcações estrangeiras, além de redução do custo com o transporte interno, maior economia energética, menos risco para o transporte e maior eficiência para o transporte em grandes distâncias.

“Ainda é difícil mensurar o exato impacto, tendo em vista a iniciativa ser incipiente e depender da adesão do mercado para funcionar. De uma forma geral, a expectativa é que ocorra uma redução de custos logísticos, sobretudo no transporte de cargas entre portos. A diversificação de modais de transporte pelo fortalecimento da cabotagem tem impacto direto na redução do Custo Brasil e no fomento da retomada de atividades econômicas e de resposta a gargalos logísticos há muito tempo identificados”, completa Mariana Avelar, advogada da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.

Expectativas

Também de acordo com Luis Fernando Resano, diretor Executivo da Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem – ABAC, ainda é um pouco difícil falar em impactos e expectativas com relação à BR do Mar, pois existem muitas regulamentações (Portarias e Decretos do MINFRA – Ministério da Infraestrutura e outros), bem como revisão de Normativos da ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários, ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária e Autoridade Marítima que precisam ser conhecidos para avaliar as opções dos novos modelos de operação das empresas brasileiras de navegação. “Entretanto, a certeza é que as empresas associadas continuarão atuando no mercado brasileiro de cabotagem, seja com novos investimentos, como ocorrido com a Elcano, que trouxe recentemente um navio de 120.000 TPB, ou com as novas modalidades de afretamento mantendo a competitividade da cabotagem e buscando oferecer cada vez mais o melhor serviço aos usuários. A cabotagem deve ser vista como uma opção aos usuários que precisam ser incentivados e beneficiados com a sua utilização.”

Alexandre, da banca Aroeira Salles, destaca que há décadas que o Brasil se ressente da ineficiência do uso de sua imensa costa marítima para melhorar a logística nacional, barateando os transportes de bens, grãos e insumos entre portos nos estados litorâneos. O referido projeto tem intuito de auxiliar na estruturação de um sistema multimodal de logística nacional, com a utilização dos transportes de cabotagem associados aos ferroviários, rodoviários e aeroportuários. “As expectativas são altas, porém, como tudo no Brasil, é demorado, por exemplo a ferrovia do frango que há anos se fala, não vejo algo a curto prazo. O lobby do setor rodoviário ainda é muito grande e isso gera uma grande força contrária aos outros modais”, emenda Mews, da CargOn.

Ana Paula, da Lira Advogados, também concorda com a questão de a nova lei tornar a matriz logística nacional mais eficiente, ligando os demais modais (rodoviário e ferroviário) à cabotagem e reduzindo a dependência do transporte rodoviário para longas distâncias.

Flexibilização de afretamento

Algumas questões também se impõem com a aprovação da BR do Mar: ao flexibilizar o afretamento de embarcações estrangeiras para serem usadas no transporte de cargas na cabotagem brasileira, a lei beneficia o setor como um todo ou acarreta problemas? Há limitações para o afretamento de navios estrangeiros?

Bastante familiarizado com estas questões, Resano, da ABAC é o primeiro a responder.

O afretamento de embarcação estrangeira sempre foi possível para atender a demanda na ausência de disponibilidade de navio de bandeira brasileira para realizar a operação de transporte na cabotagem. “O que o Programa BR do Mar inovou foi a possibilidade de a empresa trazer estes navios de subsidiária de empresas brasileiras no exterior por prazo maiores, e os navios permanecerem longo tempo nas águas brasileiras. É uma forma de aumentar a possibilidade de as empresas oferecerem mais embarcações, porém há que ter carga para que estas embarcações sejam afretadas. Um ponto de atenção é que esta possibilidade de afretamento só pode ser exercida se a empresa estiver habilitada no Programa. E essa habilitação impõe compromissos que podem ser difíceis de serem atingidos, o que pode colocar o Programa em risco de não ser utilizado.”

O diretor da ABAC faz questão de destacar que há limitações para os afretamentos ainda desconhecidas, por exemplo, para ampliação da frota, o número de embarcações será proporcional à frota de propriedade brasileira da empresa, porém ainda não se conhece a proporcionalidade. Para atender contrato de longo prazo há que ser definido também o que é contrato de longo prazo.

Na verdade, para o sócio fundador da banca Aroeira Salles, as empresas brasileiras usualmente defendem seus interesses contra concorrência de empresas estrangeiras, o que é compreensível, contudo o aumento responsável de competição com a atração de investimentos internacionais para ampliar e aprimorar a navegação de cabotagem tende a melhorar o ambiente de negócios no Brasil, já que aumentará o volume de cargas transportadas por cabotagem, com consequente redução do custo de transporte, maior proteção ambiental e diminuição do uso de caminhões para transportes em grandes distâncias.

De outro lado – ainda segundo Alexandre –, se aumentam os volumes de carga transportada por cabotagem, há aumento do transporte por caminhões em distâncias regionais, ou seja, entre os portos e os destinos no interior dos estados.

Já Mews, da CargOn, salienta que a concorrência é importante. “Como seremos competitivos sem ela?” Dessa forma, o profissional entende que o mercado precisa ser deixado em aberto para que a indústria e o consumidor final sejam beneficiados. O livre mercado precisa se ajustar e gerar as oportunidades e alternativas necessárias.

“A flexibilização do afretamento de embarcações estrangeiras beneficia o setor, pois facilita de imediato o aumento de oferta de transporte na cabotagem. A Lei beneficia o setor como um todo. Existem limitações ao afretamento de embarcações estrangeiras. Os problemas maiores são um passado pouco competitivo que causou inadimplência geral nos setores de construção naval e de transporte por cabotagem”, aponta Paulo César Alves Rocha, CEO da LDCcomex.

Alkimin, da Lira Advogados, também acredita que a Lei beneficia o setor integralmente, principalmente pelo fato de haver mais embarcações disponíveis, contribuindo para o fluxo do transporte nacional.

Segundo ele, as limitações são de ordem regulatória, como: obrigatoriamente de as embarcações terem profissionais brasileiros (comandante, mestre de cabotagem, chefe de máquinas e condutor de máquinas), serem afretadas exclusivamente por contratos de transporte de longo prazo e serem usadas exclusivamente em operações de cabotagem.

“Uma das preocupações já demonstrada por quem está na linha de frente da cabotagem é a efetividade da lei que permite o afretamento de navios a casco nu, sem exigir investimento em navios próprios. Os armadores que já operam na cabotagem defendem a necessidade de navio próprio para a obtenção do status de armador nacional. Outro dado é que o afretamento de embarcações estrangeiras a casco nu ficará sujeito à variação dos preços praticados no exterior.”

Quanto às limitações – ainda segundo Stivaletti, da Advocacia Ruy de Mello Miller, –, para as EBNs sem frota própria a lei estabelece uma “progressão” para o número máximo de embarcações afretadas: Nos termos da norma, “fica autorizado o afretamento de uma embarcação estrangeira a casco nu; após doze meses de vigência da norma, duas embarcações; após vinte e quatro meses, três embarcações; e, após trinta e seis meses, quatro embarcações”.

A lei também permite à empresa habilitada no programa BR do Mar afretar por tempo embarcações de sua subsidiária integral estrangeira ou de subsidiária integral estrangeira de outra EBN. E, para o afretamento nessa modalidade, a EBN poderá ampliar sua capacidade (tonelagem de porte bruto) consideradas as embarcações próprias “efetivamente operantes, registradas em nome do grupo econômico a que pertença a empresa afretadora, de acordo com a proporção a ser definida em ato do Poder Executivo federal”.

Aqui a norma autoriza a EBN afretar embarcação levando em conta suas embarcações próprias efetivamente operantes, ou seja, sua capacidade representada em tonelagem/porte bruto. Além da definição de “embarcação própria efetivamente operante” estar sendo objeto de deliberação pela ANTAQ, a proporção (número final de embarcações que poderão ser assim afretadas) será definida por ato normativo do Governo Federal, ensina Stivaletti.

Concentração de mercado

Pelo já visto, há temores de que a nova lei ocasione concentração do mercado, em vez de aumento da competição. Como as EBNs não precisarão investir em frota própria, o receio é que haja desestímulo à indústria naval.

Porém, Resano, ABAC, não vê que vá ocorrer concentração, pois o mercado ficou mais aberto do que estava e novos players têm mais facilidade de entrar, ainda que tenham que concorrer com empresas estabelecidas a longo tempo aqui, e que conhecem as particularidades da atividade.

“Realmente, a possibilidade de ser empresa brasileira de navegação sem investir em frota é um desincentivo a adquirir embarcações e, portanto, a indústria naval terá menos chance de ter encomendas para a cabotagem. Entretanto, o maior risco que vemos para esta liberação é submeter a volatilidade dos valores de afretamentos internacionais, que acabam sendo repassados diretamente para o serviço prestado, enquanto que a propriedade do navio possibilita a amortização do investimento durante a vida útil do navio, sendo baixo o impacto no valor do serviço prestado”, completa o diretor da ABAC.

Alexandre, da banca Aroeira Salles, também não vê risco de concentração de mercado, ao contrário, com a nova Lei há maior probabilidade de ampliar-se a concorrência, com novos players no mercado, trazendo tecnologias e investimentos.

“Quanto à indústria naval, não se pode responder de antemão e com segurança como o mercado reagirá na prática, mas é provável que a indústria naval brasileira, há muito sucateada e ineficiente, precisará, provavelmente, se especializar em reformas e manutenção de navios. O custo de aquisição de navios produzidos no Brasil é maior do que os produzidos em Cingapura, China e Coréia do Sul, por exemplo”, critica o doutor em Direito.

Mews, da CargOn, também coloca a questão da competitividade da indústria naval brasileira. Ele entende que haverá investidores de ativos (nesse caso, de embarcações) e investidores na prestação do serviço. Uma vez que a obrigatoriedade ao se locar uma embarcação seja colocar uma bandeira brasileira, ela está sujeita às nossas regras.

“Dessa forma, a própria indústria naval precisa se modernizar e se tornar competitiva. Assim como podemos fazer um paralelo à aviação, onde a Embraer é uma das mais respeitadas empresas de aviação do mundo, porém ela galgou seu lugar ao sol. Da mesma forma, precisamos construir uma empresa naval com o mesmo respeito que, com certeza, ela será competitiva e estimulada.”

A análise de Rocha, da LDCcomex, também aponta para a nossa indústria naval, já que o aumento da competição depende muito da segurança que investidores tenham no Brasil – o estímulo à construção naval no Brasil depende de investidores, brasileiros ou estrangeiros, que acreditem nela e de tecnologia mais moderna na construção de embarcações.

“A Lei permite que não haja concentração de mercado. Já tivemos estímulos à construção naval diversas vezes e sempre o setor não o aproveitou. Deve ser levado em conta que por questões tributárias e de maior produtividade estaleiros estrangeiros são mais competitivos que os brasileiros. Mas existem meios de aproveitamento desta produtividade de estaleiros estrangeiros, combinada com o acabamento de embarcações no Brasil.”

Por sua vez, Ana Paula, da Lira Advogados, lembra que a indústria brasileira já passou por momentos grande reconhecimento, assim como já teve grandes decaídas em sua produção, mesmo sem a existência das flexibilizações quanto ao afretamento. De acordo com dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento – UNCTAD de 2021, o Brasil se encontra dentre os 25 países com maior frota naval própria, encontrando-se em 17º lugar.

“É recente ainda para afirmar se os receios quanto à concentração de mercado serão concretizados, porém cabe destacar que Lei também foi pensada buscando desenvolver o incentivo à indústria naval. No entanto, a nosso ver, o incentivo à navegação por cabotagem tem maior destaque e é o que promoverá maiores impactos e benefícios, ainda que utilizando embarcações estrangeiras.”

Stivaletti, da Advocacia Ruy de Mello Miller, completa esta questão destacando que a concentração de mercado é assunto invariavelmente presente na discussão afeta à cabotagem, mas o objetivo é justamente ampliar a oferta e retirar as barreiras de entrada. Entretanto, não podemos esquecer que aqueles que figuram hoje no mercado estão investindo na cabotagem há muitos anos. Se existe “vantagem”, ela decorre como contrapartida aos investimentos realizados por tais empresas, que ao longo do tempo acreditaram na navegação de cabotagem.

“Também vale ressaltar que, para diminuir eventual disparidade, a própria Lei não está exigindo que, necessariamente, a EBN habilitada no BR do Mar tenha navio próprio. A lei franqueia o afretamento a caso nu àquele que não seja detentor de capacidade própria (não tenha embarcação própria). A lei objetiva criar condições, portanto, para o surgimento de novos entrantes, ainda que desprovidos de embarcação de sua propriedade.”

Em relação a um pretenso desestímulo à indústria naval, o sócio na Advocacia Ruy de Mello Miller crê que a norma se preocupa em preservá-la quando estabelece incentivos. A título de exemplo, a lei permite que o produto da arrecadação do AFRMM destinado a empresa brasileira de navegação seja movimentado para manutenção realizada por estaleiro brasileiro ou para garantia à construção de embarcação também em estaleiro brasileiro.

“O tema indústria naval, em verdade, não pode ficar adstrito ao programa BR do Mar, porque existem outras frentes capazes de fortalecer a indústria naval brasileira. Os olhos desse segmento, em nosso sentir, devem estar (e estão) voltados às oportunidades decorrentes da navegação de apoio. Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo – ABEAM, em novembro de 2021 a frota de apoio marítimo em águas brasileiras contabilizou 391 embarcações, sendo 357 de bandeira brasileira.”

Aumento da participação da cabotagem

Segundo o governo, a “Lei nº 14.301 reúne uma série de medidas que visam aumentar de 11% para 30% a participação desse meio de transporte na matriz logística nacional, ampliando o volume de contêineres transportados para 2 milhões de TEUs – unidade equivalente a 20 pés – já em 2022, além de alavancar em 40% a capacidade da frota marítima dedicada à cabotagem para os próximos três anos”.

“Eu gostaria que tudo isto acontecesse, porém avaliamos como superestimado. Devemos lembrar que a cabotagem transporta basicamente a produção e insumos da economia doméstica, e como a economia não vem tendo resultados expressivos, não é esperado um crescimento tão grande como citado. O crescimento que pode ocorrer será pela migração entre modais fazendo melhor uso do modal aquaviário”, avalia Resano, da ABAC.

Sobre o que precisa ser feito por parte do governo e das empresas para que esta meta seja alcançada, ele coloca que é muito comum comparar o custo da cabotagem com o longo curso, porém, no longo curso os custos tributários e trabalhistas são bastante diferentes dos brasileiros e isto, de alguma forma, precisa ser atacado pelo governo para oferecer serviço a menor custo para os usuários que acabam sendo os beneficiários finais. As empresas buscam segurança jurídica para fazer investimentos e mudanças de regras são sempre ruins para os valores investidos na atividade. “Com segurança jurídica certamente haverá mais investimento das empresas e podem ser de origem nacional ou estrangeira, como ocorre nos diversos setores da economia nacional, mas sempre preservando a soberania e segurança do país.” Resano completa apontando, entre os problemas existentes e que precisam ser superados para que esta meta seja atingida, a necessidade de uma política de estabilidade do combustível semelhante para todos os modais. “No tocante à redução de custos da cabotagem, infelizmente nada foi relacionado ao combustível. Nenhuma política de preços igualitária entre os modais para o combustível, sendo que ele possui representação de 40 a 60% (a depender da variação do preço pois na cabotagem é cotado em dólar no mercado internacional, convertido em reais e adicionado o ICMS) do custo do serviço prestado no transporte marítimo.”

Adicionalmente, o diretor da ABAC ressalta que o custo tributário e trabalhista da atividade de transporte marítimo precisa ser olhado com atenção e dedicação.

Também falando sobre as previsões governamentais, Alexandre, da banca Aroeira Salles, coloca que não há dúvidas que tenderá a haver aumento do volume de carga transportada em cabotagem, contudo não se pode precisar o percentual de aumento. Cumprirá ao Governo aprimorar a regulação do setor, e a iniciativa privada precisará investir em novos navios e estruturas portuárias.
Mais otimista, Mews, da CargOn, acredita que esta previsão pode ser alcançada, entendendo que é um número singelo, perto do tamanho de nossa logística, que representa 12% do PIB nacional.

Mas, para que isto ocorra, é preciso estimular até que exista um aculturamento do negócio. “Uma vez que a cultura da cabotagem esteja firmada e as indústrias tenham segurança em deixar seus bens para o transporte, isso irá evoluir organicamente.” Mas, para isto, primeiro será necessário superar o problema de cultura e, segundo, oferecer mais concorrência para esse modal.

Outro profissional do setor que acredita que esta previsão pode ser alcançada é Rocha, da LDCcomex. Desde que existam investidores e empresas dispostas a entrar no negócio de navegação por cabotagem. Pelo seu lado, o Governo precisa regulamentar a Lei e cumprir as metas de financiamento previstas, enquanto as empresas precisam ser competitivas no mercado de logística. “Há percepção por toda a sociedade e pelas empresas em particular que devemos mudar de modal rodoviário e usar mais o modal marítimo e fluvial, porque de nada adiante ter incentivos para aumentar a oferta se continuarmos a querer soluções mais caras de porta a porta por caminhões. Simplesmente haveria oferta, mas as empresas não teriam faturamento.”

Para provar que estas metas são exequíveis, Alkimin, da Lira Advogados, revela que estudos da ANTAQ apontam um aumento do uso da cabotagem: de 2018 para 2019, houve um aumento de 6% no uso desse transporte.

Por outro lado, diz o advogado, tanto o governo quanto as empresas do setor indicam os seguintes problemas: tempo de transporte muito alto, poucas rotas, frequência muita baixa de navios, falta de confiabilidade no transporte e atraso nas entregas das mercadorias.

Também para Stivaletti, da Advocacia Ruy de Mello Miller, se olharmos os dados estatísticos referentes ao crescimento da cabotagem, o horizonte é alvissareiro. Sem a BR do Mar, o crescimento da navegação de cabotagem ocorreu na ordem de 14% em 2021, conforme dados da ABAC. Com a BR do Mar e os consequentes estímulos trazidos pela Lei, o crescimento tende a continuar na casa dos dois dígitos, mas é um setor que depende da atividade econômica.

“Não obstante, não podemos relegar que, estando diversas matérias relevantes da Lei nº 14.301/22 ainda dependentes de regulamentação pelo Poder Executivo – a exemplo do número de embarcações passíveis de afretamento, considerada a capacidade operante da EBN -, as empresas devem esperar para conhecer onde, realmente, estarão as oportunidades para saltos ainda maiores da navegação de cabotagem. Outrossim, não menos importante entender que o crescimento, claro, estará pari passu com a cena econômica do país.”

Papel da EBN-i

O texto da lei destaca o papel da Empresa Brasileira de Investimento na Navegação (EBN-i), que deve constituir frota e fretar as embarcações para as EBNs operarem, dispensando a necessidade de elas investirem em frota própria.

Para Resano, da ABAC, trata-se de uma inovação bem-vinda, mas a ser testada ainda. “Acreditamos que, para a navegação interior, pode ser bastante viável, pois o custo do bem é relativamente baixo, mas para embarcações de cabotagem os valores são elevados e ainda não sentimos investidores com apetite para imobilizar valores significativos por períodos longos (25 anos). Preocupa serem meros atravessadores de afretamento de embarcações sem a realização de investimento como pensado no princípio.”

Já na visão de Rocha, da LDCcomex, a Lei possibilita que uma empresa possa ser organizada apenas para ser proprietária de embarcações e afretá-las, o que é um dos grandes progressos da Lei. “É viável e tudo depende de investidores que queiram entrar no negócio de navegação por cabotagem ou construir embarcações para afretá-las. Depende também de como um investidor possa retomar uma embarcação em caso de inadimplência e da existência de um mercado que possa absorver as embarcações por acaso retomadas.”

Também para Ana Paula, da Lira Advogados, o formato da EBN-i é muito interessante para o setor. A grande vantagem é o comprometimento da embarcação para o mercado brasileiro e a possibilidade de aumento da frota de embarcação, sem a necessidade de custos com a fabricação nacional.

“O custo para se construir uma embarcação é muito elevado, esse problema dificultava o desenvolvimento do setor, justamente pela ausência de estaleiros no Brasil. Com a EBN-i, há a figura de uma empresa investidora especifica para o setor, o que possibilitará o aumento do ambiente de negócios para o país.”

Para Stivaletti, da Advocacia Ruy de Mello Miller, do ponto de vista do fretador, aquele que disponibiliza a embarcação, a norma em verdade inova ao apresentar uma nova figura, a denominada Empresa Brasileira de Investimento na Navegação. A atividade fim desta empresa, portanto, está voltada estritamente à constituição de frota para o fretamento de embarcações a terceiros.

O objetivo da proposição legislativa agora vigente é a interação entre as atividades (EBN-i x EBN), como forma de alavancar a cabotagem.

Por um lado, prossegue o advogado, vislumbra-se o advento de empresa constituída com o fim de investir em embarcações próprias, apenas para disponibilizá-las no mercado (fretadora). Por outro, passa-se a admitir que empresa de navegação nacional se arvore como entrante, ainda que não seja detentora de embarcação própria (afretadora).

“Parece-nos que o legislador vislumbrou estabelecer uma ‘oportunidade’ ao entrante sem navio e, ao mesmo tempo, outra oportunidade àqueles que desejam investir em frota própria, mas sem operá-la comercialmente. Algo que em outros países é figura comum, quando o proprietário não acumula a função de armador (‘proprietário não armador’)”, completa Stivaletti.

Segurança jurídica

Como já mencionado, outro ponto em destaque é se a BR do Mar irá trazer mais segurança jurídica para a navegação de cabotagem.

Na visão de Resano, da ABAC, é muito cedo para fazer esta afirmação, e, “como disse, notamos que o Programa BR do Mar, na questão trabalhista, trouxe mais insegurança do que segurança. Nos demais aspectos, a segurança jurídica só será sentida pela estabilidade da legislação, uma boa regulação com rigorosa fiscalização por parte das Agências envolvidas.”

Já para Alexandre, da banca Aroeira Salles, o novo marco legal traz muito mais segurança jurídica para o setor de navegação de cabotagem, pois moderniza várias regras que vinham sendo questionadas perante o Poder Público e até mesmo perante o Judiciário.

“Creio que melhorará. Hoje a cabotagem já existe no Brasil, tem funcionado bem, a questão é trazer mais opções para as indústrias e empresas de logística. Se uma coisa o governo faz bem é regulamentar para não deixar escapar nenhum centavo em impostos”, completa Mews, CEO da CargOn.

Para Ana Paula, da Lira Advogados, considerando não haver até o momento regulamentação para o Programa, quanto a regras para habilitação e acompanhamento dos parâmetros trazidos pela Lei, por exemplo, a segurança reside na garantia de desenvolvimento ao setor, estimulando as EBNs e a frota já existente na operação de suas linhas.

Rocha, da LDCcomex, acrescenta que a Lei muda critérios de afretamento, mas deixa para regulamentação muitos aspectos. “Então, no meu entendimento, não traz mais segurança jurídica.”

“Um dos objetivos da legislação foi, sim, conferir maior segurança jurídica a esta modalidade de navegação, sobretudo pela redução de algumas barreiras de entrada que dificultavam sobremaneira a operação de navios estrangeiros em território nacional, a exemplo do anterior procedimento de circularização para verificar, em cada operação, a disponibilidade de navios brasileiros para atendimento de cargas. Alguns pontos de insegurança, contudo, não foram sanados.”

Mariana, da Manesco Advogados, destaca em especial a insegurança interpretativa que resulta da redação do art. 12 da BR do Mar. De um lado, a cabeça do artigo indica que “aos contratos de trabalho dos tripulantes que operem em embarcação estrangeira afretada na forma prevista nesta Lei serão aplicáveis as regras internacionais estabelecidas por organismos internacionais devidamente reconhecidos, referentes à proteção das condições de trabalho, à segurança e ao meio ambiente a bordo de embarcações, e a Constituição Federal”. De outro, seu parágrafo único parece sugerir que normativas nacionais poderiam se sobrepor às normas internacionais mesmo no caso da tripulação de embarcação estrangeira na medida em que indica que “o disposto em instrumento de acordo ou convenção coletiva de trabalho precederá outras normas de regência sobre as relações de trabalho a bordo.

Outros pontos do novo marco legal precisam de intensa e diligente regulamentação para que sejam operacionalizados, ainda de acordo com a advogada. Destaca-se, em especial, a aferição das hipóteses de cabimento caso de afretamento por tempo (Time Charter). É especialmente relevante a regulação das operações especiais de cabotagem e dos limites de afretamento em relação à atual capacidade em operação no Brasil

Também falando em termos jurídicos, Stivaletti, da Advocacia Ruy de Mello Miller, ressalta que o principiar da segurança jurídica é a determinação de um marco legal, o que aconteceu com o advento da Lei 14.301/2022. Naturalmente, as relações estabelecidas pela novel legislação precisam se consolidar, o que somente virá com o tempo e amadurecimento dos institutos.

Ainda, é importante lembrar uma peculiaridade da BR do Mar, a ampla margem conferida ao Poder Executivo para regulamentar diversos temas de relevo. Conforme já mencionado, mesmo para se constituir como EBN, os requisitos dependerão de regulamentação. Igualmente para a habilitação ao programa, uma vez condicionada a ato normativo posterior. Outro dado extremamente sensível, como o número de embarcações passíveis de afretamento por empresa brasileira de navegação, considerada a capacidade (porte bruto) efetivamente operante, também será definido por “Ato do Poder Executivo Federal”.

Outros pontos deveras sensíveis – como o estabelecimento de descontos nas alíquotas do AFRMM e os critérios para identificar a equivalência de tonelagem (capacidade) entre as embarcações – também ficarão sob o crivo de posterior regulamento pelo Executivo.

“Nossa impressão é que determinadas questões caras à navegação de cabotagem e seu fomento poderiam estar já contempladas na lei, permitindo debate mais amplo e a participação plena dos representantes legitimados para tanto. Da forma como apresentado o texto, todavia, são inevitáveis os questionamentos sobre os dispositivos que delegam – por vezes em excesso – a regulamentação pelo Poder Executivo”, completa Stivaletti.

Cabotagem e transporte rodoviário

Segundo estudo do Instituto Ilos, cerca de 22 milhões de toneladas de cargas transportadas por estradas poderiam ser entregues por navios, fomentando a cabotagem, se o modal absorvesse o transporte de cargas feito por rodovias em todo o país. O Instituto afirma ainda que 21% das grandes indústrias brasileiras, aquelas que movimentam maior volume de cargas, têm a intenção de trocar de modal, sair do rodoviário e optar pela cabotagem nos próximos anos.

Daí logo surgiu a discussão de que a Lei do Mar poderia reduzir a competitividade do setor rodoviário. “Essa afirmação não tem fundamento por um motivo muito simples: não existe cabotagem sem caminhoneiro. Basta pensar que um navio com 3.000 contêineres significa que 3.000 contêineres precisam chegar ao porto e depois precisam ser desembarcados.”

Ainda segundo Mews, da CargOn, o modal rodoviário no Brasil já opera de forma não otimizada. Um caminhão jamais deveria percorrer mais de 1.000 km para fazer uma entrega. Com entregas mais curtas, serão feitas mais viagens e, por consequência, haverá mais faturamento e menos tempo parado. “Imaginem a redução de filas em portos, quanto tempo parado que iremos eliminar? Imaginem um caminhoneiro estando todo final de semana em casa ou tendo mais folga para cuidar de sua vida e sua saúde? Imaginem uma malha rodoviária com menos caminhões melhorando toda nossa infraestrutura?

O então ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, definiu bem, na ocasião da sanção da lei, quando disse: “Navio não vai em fazenda, navio não para na indústria, não para no supermercado. O único transporte que faz isso é o caminhão”. Esses serviços continuarão sendo necessários para transportar as mercadorias destinadas ou oriundas dos portos. Além disso, o mercado de cabotagem não compete com os principais fluxos rodoviários do país, que são intra-regionais (pelo interior) ou para exportação (interior-litoral). Estes corredores, que representam os maiores volumes de cargas transportadas no país, não estão disponíveis para cabotagem, ainda de acordo com o CEO da CargOn.

Adriano Depentor, presidente do SETCESP – Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região, também fala sobre a polêmica de que a BR do Mar vai lesar o setor de transporte rodoviário.

“Acredito que isto não irá ocorrer. Pelo contrário, a intermodalidade é positiva para o país, por tornar a logística de cargas mais eficiente, principalmente no que diz respeito ao transporte de grandes massas, como agronegócio e minérios. O transporte rodoviário acaba ficando mais na distribuição, afinal o navio não vai chegar na farmácia, no supermercado e nem dentro da indústria, por exemplo. Então, o transporte rodoviário de cargas ainda continuará sendo o principal ator das atividades do setor, sendo essencial, sobretudo, na primeira e última milha.”

Resano, da ABAC, faz questão de reforçar que a cabotagem não compete com o rodoviário. Por outro lado, uma possível concorrência só ocorreria em cargas conteinerizadas, pois cargas a granel são impensáveis viajarem por rodovia. “Como dito anteriormente, o governo deve trabalhar para que todos os modais possam estar disponíveis para o usuário e cabe a ele optar pelo que melhor atende. Optando pelo marítimo, o rodoviário será sempre o parceiro da cabotagem, pois o navio não consegue chegar ao destino final da carga e precisamos do rodoviário para que faça isto.”

Alexandre, da banca Aroeira Salles, também não acredita que haverá perdas para o transporte rodoviário, ao contrário, toda a evolução dos modais de logística de uma nação auxiliam no crescimento econômico, trazendo desenvolvimento de toda a cadeia multimodal de transporte. O que acontecerá, segundo o advogado, é a necessidade de adaptação de parte dos transportadores rodoviários, que deverão ver diminuídos os transportes de carga em longas distâncias entre estados litorâneos, mas aumento dos transportes de carga entre portos e seus destinos, e vice-versa.

Alkimin, da Lira Advogados, é outro representante do setor que acredita que o setor rodoviário não será prejudicado. Ao contrário, será um grande aliado na busca da modernização da logística nacional.

O transporte de cargas por longas distâncias, por rodovias, tem problemas bem conhecidos: estradas esburacadas, motoristas em perigo nas estradas, uma grande quantidade de acidentes envolvendo motoristas.

“A cabotagem reduzirá esses problemas, beneficiando também o setor rodoviário. Além disso, é fato que mesmo com eventual aumento do uso da cabotagem, também aumentará a demanda pelos caminhões, que continuarão sendo o elo de ligação entre a origem e o destino no transporte nacional.”

Mariana, da Manesco Advogados, também não considera que uma medida que visa fomentar a competição intermodal seja, por si só, lesiva à um modal de transporte, sobretudo considerando as proporções continentais do Brasil.

Eventual impacto extraordinário e negativo da medida em projetos específicos (por exemplo, rodovias concedidas), precisaria ser olhado caso a caso, de acordo com o que dispõe a matriz de risco dos respectivos contratos, avisa a advogada.

“O Brasil tem erradamente uma opção por transporte rodoviário para médias e grandes distâncias, então qualquer medida que venha a corrigir esta opção, como vem sendo feito, acarretará a diminuição do setor rodoviário, que deverá se rearranjar para ser um complemento dos modais ferroviário e hidroviário”, acredita Rocha, da LDCcomex.

Concluindo, Stivaletti, da Advocacia Ruy de Mello Miller, também diz não enxergar tal competitividade, tampouco lesão aos transportadores rodoviários de carga.

Ele lembra que o Brasil é um país de dimensões continentais e possui, consequentemente, totais condições de recepcionar todos os modais. “Aqui revolvemos o nosso raciocínio inicial para dizer que o grande ganho para o país é a integração entre os modais, que acomode todos os atores e intervenientes do transporte, de forma que o resultado final alcançado contemple a parte mais importante, o usuário e a carga.”

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