Fonte: Correio do Povo | Publicado em 3/7/2021 | Clique aqui e leia a publicação original
Conjunto de práticas que mantém organizações em conformidade com leis, normas e seus valores ganha força no agronegócio
Prática cada vez mais disseminada em empresas de todos os segmentos, o compliance tem ganhado espaço também no agronegócio. O conceito representa um conjunto de regras que mantêm uma organização em conformidade com leis, normas e seus próprios valores, auxiliando na prevenção, detecção e reparação de irregularidades e ilegalidades. A iniciativa ganhou força no setor com o lançamento do selo Agro + Integridade, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em 2018, na esteira da Operação Carne Fraca, da Polícia Federal. No ano passado, tal distinção foi entregue a 19 empresas.
Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) em 2020 identificou a governança e gestão como o segundo principal gargalo do agronegócio, atrás somente da infraestrutura. Responsável por mais de um quarto do PIB nacional, o agronegócio vem cada vez mais assimilando o compliance em suas operações, inclusive para dirimir e sanar problemas oriundos da sua própria robustez. Quem afirma é Rodrigo Provazzi, sócio da PwC Brasil e responsável pela prática de Governança, Riscos, Controles, Compliance e Auditoria Interna na Região Sul. De acordo com ele, a má impressão deixada pela Operação Carne Fraca, em 2017, fez com que as empresas do setor despertassem para a necessidade de criação de áreas de compliance interno. O objetivo era demonstrar que os produtos agropecuários do Brasil seguiam em conformidade com as regulamentações nacionais e internacionais.
O interesse crescente pelo tema popularizou o uso da sigla ESG (Environmental, Social and Corporate Governance), que, em português, significa responsabilidade ambiental, social e governança. “Um dos pilares de ESG, as boas práticas de governança corporativa, com gerenciamento de riscos e compliance, a criação de conselho de administração e seus comitês de supervisão, entre outros, são primordiais para alavancar o crescimento dos negócios”, observa Provazzi. Segundo dados da Family Business Survey 2021 da PwC, 85% das empresas familiares têm alguma política ou procedimento de governança.
O especialista entende que as empresas que buscam se adaptar às transformações do mercado precisam ter uma estratégia clara de ESG, que inclui as práticas de compliance. Com isso, de acordo com ele, é possível criar bases sólidas para o crescimento e sustentabilidade do negócio, conquistando a confiança de clientes, colaboradores e investidores, além dos demais stakeholders. “Quanto mais cedo isso for incorporado aos planos de ação, maiores as chances de sucesso”, afirma.
Quando a advogada Clarissa Grecellé, do escritório Martinelli Advogados, começou a trabalhar com compliance, muitas vezes era necessário explicar às empresas o que significava aquela palavra estrangeira. Hoje, isso não se faz mais necessário, o que demonstra que a prática está consolidada. Na opinião dela, mais do que manter práticas em conformidade, é preciso apresentar evidências destas ações. “A grande questão para o agro é uma mudança de cultura não em relação ao que eles praticam, mas em relação à necessidade de formalizar isso e informar os públicos”, detalha.
Clarissa ressalta que muitas empresas do setor já adotavam as práticas, porém de um modo intuitivo. “A cultura era algo repassado internamente. As empresas viram no compliance uma forma de tornar isso transparente para o mercado”, resume. Desta forma, surgiu o selo Mais Integridade, do Ministério da Agricultura. A imagem da empresa passa a ser beneficiada com o programa de compliance. No caso do selo do Mapa, as empresas premiadas conquistam o direito de divulgá-lo nas embalagens dos seus produtos e em suas ações institucionais. O reconhecimento representa um diferencial competitivo, em especial para quem busca o mercado de exportação.
De acordo com Clarissa, o público que busca o compliance é formado por empresas de médio e grande porte e cooperativas, porém também há espaço para as empresas. “Existem programas de todos os tamanhos. Dependendo dos riscos e do tamanho da empresa, ela pode requerer um investimento maior, mas também pode fazer um programa customizado e adequado à realidade de uma pequena e média empresa”, explica. A advogada ressalta que, no passado, havia uma ideia equivocada de que o compliance era uma iniciativa muito cara, voltada apenas às multinacionais e grandes empresas, o que já foi desmistificado nos últimos anos.
Além de iniciativas anticorrupção, de ESG ou de valorização das mulheres, um dos focos dos programas de compliance no agronegócio tem sido a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “O agro está se digitalizando completamente”, justifica Clarissa. “Tem muitos aplicativos que estão sendo feitos para o segmento, para linkar, por exemplo, a cooperativa com o cooperado. Para desenvolver isso, é preciso estar em conformidade com a LGPD”, observa.